Cidade Cubatão

Enquanto as mortes não chegam

Por Dojival Vieira.

 

As medidas adotadas pelo prefeito Ademário no combate ao coronavírus partem de uma idéia bem intencionada, mas equivocada: o prefeito acha que desinfetar ruas e praças com hiplocorito (água sanitária), além de repetir recomendações das autoridades sanitárias, é o suficiente.

Não é.

Cubatão tem dois terços da população, vivendo em absoluta precariedade, sem condições sanitárias e de higiene, sem rede de esgotos e, em alguns casos, sem sequer água disponível.

Nestas condições, a política de isolamento social, a medida recomendada para quem pode ficar em casa é absolutamente ineficaz. Como pedir isolamento num cômodo em que se amontoam seis, sete pessoas?

O prefeito acha que desinfetar os becos e caminhos dessas áreas, é a medida certa. Será que alguém acha mesmo que desinfetar caminhos em favelas protege nesmo a população do contágio?

Puro marketing, aliás de péssima inspiração, porque deseduca e ilude, passando à população a falsa idéia de proteção.

Nestes casos, todos sabemos, a eficácia da prevenção esta diretamente relacionada a outro tipo de medida: o isolamento vertical, ou seja, aplicar maciçamente os testes, isolar os infectados para impedir a propagação do vírus.

Mas, aí a desculpa é: não há testes suficientes para todo mundo, e mesmo se houvessem, faltam recursos.

O preço a pagar numa cidade que tem um orçamento bilionário é alto: é em vidas humanas que poderiam ser poupadas.

Cubatão tem estimadamente 130 mil habitantes, considerando que só 1% precise de atendimento hospitalar, temos 130 pessoas. Temos apenas 10 leitos para tudo, não apenas para o coronavírus. Significa que, no caso de haver necessidade de respiradores artificiais, de uma vez, 120 pessoas estão condenadas a morte.

Embora, admita-se, que tenha noção da gravidade do problema, falta ao prefeito competência, visão ampla de gestão de una crise dessa magnitude.

Empresas como a Gerdau, a Ambev e o Hospital Albert Einstein anunciaram a doação de um centro de tratamento de Covid-19 com cem leitos à prefeitura de São Paulo, relata o jornalista Élio Gaspari, na edição da Folha deste domingo (29/03).

Em duas semanas entregarão 40 leitos e, até o fim de abril, estarão prontos os outros 60. A unidade atenderá pacientes do SUS.

A Gerdau doará a estrutura do prédio, a Ambev bancará o custo, e o Einstein cuidará dos pacientes. Nenhum grande acionista da Gerdau ou da Ambev ficará mais pobre com a doação.

O colégio Miguel de Cervantes, situado nas proximidades do Einstein, abriu 300 vagas para filhos de enfermeiros, técnicos e médicos do hospital. A escola ocupa uma área de 60 mil metros quadrados e as crianças ficarão lá durante os turnos dos pais, assistidos por voluntários, sem contato físico. O hospital fornecerá a alimentação da garotada. Outro colégio da cidade, o Porto Seguro, aderiu à iniciativa.

Em Manaus, uma rede de lojas Bemol doou ao governo do estado seu estoque de mil colchões e máscaras. No Rio de Janeiro, pizzarias continuam mandando refeições aos profissionais de saúde da cidade. Alguns deles trabalham em turnos de 24 horas.

Não seria a hora do prefeito de Cubatão assumir o papel de chamar as empresas do parque industrial – o mais importante do Brasil e da América Latina – e cobrar delas uma participação efetiva com a montagem de um Hospital de campanha, com leitos disponíveis para a situação de emergência previsível?

Ou essas empresas, representadas pelo CIESP, acham que o seu papel é despejar as toneladas de produtos químicos, que já fez com que a cidade ficasse conhecida no mundo, como Vale da Morte?

Próximo artigo: As medidas para garantir proteçåo social à população que o prefeito ignora.

Cubatão, 29/março/2020

DOJIVAL VIEIRA
Advogado, jornalista, presidente do Diretório do PDT/Cubatão

 

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