Paradigmas Filosóficos

Tempos de cegueira epidêmica e seletiva

Em que tempos estamos? Tempos de cegueira epidêmica e seletiva. Tempos de inércia catatônica advindas de uma hipnose virtual de fazer George Orwell ter orgasmos múltiplos na confirmação de seus delírios proféticos. Enquanto isso se acentua a luta de classes e a burguesia tripudia sobre a classe operária sob a égide de uma justiça “sub messiânica”, expandindo-se numa densa nevoa que nos entorpece da convicção da nova inquisição.

 

A iminente perda de direitos históricos e imprescindíveis passa despercebido de nossos olhos enquanto sofremos bombardeios sublimes de um consenso fabricado e alertado pelo nosso amigo Chomski. 

A verdade transita entre um relativismo vazio e um dogma inquestionável em meio a esse turbilhão de fatos e flertes. Resta a grande massa a busca individual da felicidade em tempos de Big Brother e neopentecostalismo. Em seu texto “da felicidade’, Séneca nos diz que quanto mais se busca a felicidade mais dela se distancia. Volto a falar sobre os tempos de hipnose virtual já com outros elementos sintomáticos e epidêmicos como a histeria coletiva, o ódio irracional, a violência mecânica e a fé incondicional teleguiadas por pastores acima de qualquer suspeita pois sua autoridade vem de Deus tais como seus bens e sua missão de garantir a exploração de classe. Afinal, a Cezar oque é de Cezar e a Deus o que é de Deus. Mas quem é quem nessa dança dos vampiros?

Ainda sobre a felicidade que aparece em várias formas, na esfuziante explosão pentecostal ou no prazer delirante do consumo dos bens que o tão amoroso capitalismo nos proporciona e garante nossa tão codificada felicidade, palavra essa que vem se mostrando repetitiva nesse texto, mas é um instrumento chave na ligação das peças que compõe a exploração e os instrumentos e acima de tudo sentimentos que a burguesia usa para avançar em sua hegemonia.

Reprodução ideológica e moral

Epicuro, em uma carta sobre felicidade endereçada a Meneceu, diz algo importante sobre como a ideia de Deus se molda as relações sociais e são instrumentalizadas por quem a dirige. Devemos entender a relação da filosofia com a religião ou espiritualidade nesse momento. Mas voltando ao assunto, ele diz o seguinte: “Os Deuses de fato existem e é evidente os conhecimentos que temos deles. Já a imagem que a maioria das pessoas fazem deles essa não existe.”

Assim como José Paulo Neto, eu também me intitulo um marxista impenitente, opto pela análise materialista da coisa e descarto a existência dos tais Deuses. Mas essa micro análise serve para captarmos fragmentos da essência que nos leva a mais profunda alienação. Entre elas, a doutrina da busca da felicidade, seja pela religião ou seja pelo consumo. Tais fatores nos limitam a expectadores da luta de classes, o que nos coloca no campo do inimigo tanto por não haver neutralidade histórica ou ausência ideológica, pois os conceitos dominantes são da classe dominante, cada vez mais consolidados pelos aparelhos de reprodução ideológica, mídia, escola, religião e moral.

O avanço do pós-modernismo e o que eles chamam de negação das grandes narrativas, e é claro, a mais demonizada, o marxismo, se consolidada numa visão de sociedade fragmentada do individuo e seus micro mundos em suas convulsões acéfalas em esferas de desligamento e alienação que inviabiliza a organização da classe trabalhadora e nos situa no tecnológico e miserável inferno de Dante.

Para finalizar esse emaranhado e confuso texto, reafirmo a importância da descontaminação da inércia epidêmica em que estamos. A construção dialética de novas formas de debate e organização é imprescindível para avançarmos, rasgar as cartilhas, negar os dogmas e seguir adiante sem ilusões de um milagre revolucionário ou de mais um submessias. Esses são tempos de reinvenção de nós mesmos pra manter acesa a chama da liberdade e da luta revolucionária.

Ah, e quanto a felicidade nem Séneca nem Epicuro: fico com o velho Odair José, que canta que felicidade não existe, o que existe na vida são momentos felizes…

Odair Dias é poeta, assistente social, licenciado em historia e sociologia e pós-graduado em política e relações internacionais.

Artigo originalmente publicado na “José Martí“.

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