Por Marta Ramalho,
Médica Infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, desde 1992
Na última terça-feira, saí do meu plantão emiliano muito triste e envergonhada. Triste por ter acabado de saber que mais um andar (desta vez, o oitavo) se transformará em unidade SPDM. Com o pretexto quiçá falso de que não há enfermagem suficiente. Pretexto, aliás, não suficientemente demonstrado e combatido por quem teria a possibilidade de revertê-lo. Ao final, do Emílio “Raiz”, sobrará, até aqui, o ambulatório, uma UTI, o PS, o terceiro andar e o sexto andar.
Esse estado de coisas não teria ocorrido sem a aquiescência imoral da diretoria do hospital, cujo diretor, em live recente com o corpo clínico, disse textualmente que se o plano fosse a privatização da instituição, ele estaria fora, que não concordava com isso.
Ora, não é isso o que vemos…
1. O modelo de gestão das enfermarias, chefiado por alguém que não tem vivência de unidades de internação, causou chagas e danos aos colegas e aos pacientes;
2. Os residentes vão se espremendo e sofrendo com a falta de locais para exercício e treinamento de suas funções (para além do “samba de uma nota só”, o parco corpo clínico e a estrutura verticalizada das enfermarias promovem uma formação muito aquém da desejada);
3. O hospital fechou a pediatria, esmagou os pediatras, solapou o ambulatório pediátrico;
4. A SPDM avança inclemente sobre as unidades, inclusive internando pacientes de sexo diferente no mesmo quarto, sem se preocupar com questões minimamente humanizadas;
5. O concurso que deveria ocorrer no menor prazo possível para repor quadros perdidos não tem menor perspectiva de acontecer.
Muito mais eu poderia falar para externar a minha tristeza de enxergar que, ao acender das épocas supostamente festivas, mais um pedaço do nosso Emílio Ribas é destinado à desnecessária e destrutiva terceirização. Sim, no apagar do ano de 2020, se amputa mais um pedaço desta instituição. Sorrateiramente…
Mas eu preciso falar da vergonha. Vergonha alheia, devo dizer. Vergonha da diretoria que prepara, como xeque-mate, o fechamento da porta do PS para liquidar de vez a fatura. Vergonha de ter um secretário de estado da saúde tão centrado nas palavras corretas que se esqueceu dos atos que pudessem dignificar o seu local de origem. Afinal de contas, foram necessárias muitas décadas para que tivéssemos um secretário emiliano. E, paradoxalmente, será esse secretário emiliano que lacrará a natureza pública e plural de assistência, ensino e pesquisa do nosso hospital. Imensa vergonha desses chefes que nunca chegarão a ser líderes…”