12 JAN 2020 07h:01
Ambientalistas e especialistas da Baixada Santista estão preocupados com a iniciativa da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) ao realizar, até 19 de fevereiro, consultas e audiências públicas, em Brasília (DF) e não na região, que visa o recebimento de propostas para a norma que regulamenta as operações de transbordo de navio para navio e o subsequente transporte a granel de petróleo, seus derivados, gás natural e biocombustíveis.
Segundo acreditam, a verdadeira intenção é avalizar um terminal da Companhia de Gás de São Paulo (Comgás), que está sendo implantado, com pouca publicidade, no local conhecido como Largo do Caneu, no canal de acesso ao Porto de Santos, próximo ao terminal da Ultracargo e à Cava do manguezal do Largo do Casqueiro, em Cubatão. Integrantes da Associação de Combate aos Poluentes já ingressaram com representações nos ministérios públicos Estadual e Federal (MPE-SP e MPF).
O terminal será uma plataforma na qual ficarão atracados navios, com tanques capazes de transportar 85 mil toneladas de gás liquefeito e outros vaporizadores. Uma tubulação de 20 polegadas de diâmetro e extensão de 8,5 quilômetro levará esse gás de Santos a um conjunto de instalações que fará a sua distribuição conhecido como City Gate em Cubatão. Todo esse aparato permitirá o transporte diário de 14 milhões de metros cúbicos de gás.
ALERTAS
Os ambientalistas fazem vários alertas. Um deles é sobre a posição estreita do canal de navegação que possibilita choques entre embarcações. Outro é o traçado das tubulações de gás – por baixo do Canal de Piaçaguera e do Rio Cubatão – alvos de constantes dragagens. “Além disso, a tubulação passará ao lado de empresas e comunidades, sobretudo no Jardim Costa e Silva (Cubatão). Não pode ser aceitável expor populações urbanas a esse risco”, apontam os especialistas no documento enviado aos ministérios públicos.
O procurador da República, Antônio José Donizetti Molina Dalóia, um dos responsáveis pelo Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) envolvendo o incêndio de Ultracargo, e a promotora Almachia Zwarg Acerbi, do Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente (GAEMA-MPE-SP), que acompanhou a situação de Termoelétrica de Peruíbe, empreendimento que não caminhou por conta da pressão popular e de ambientalistas da região, foram acionados.
NAVIOS-BOMBA
Conforme alertam, os milhares de metros cúbicos de gás, cujo ponto de descarga é extremamente perigoso, poderá afetar outros depósitos de combustíveis e produtos químicos. Eles enfatizam que, em caso de vazamentos, falhas estruturais e operacionais de acoplamento; vaporização ou bombeamento poderão causar uma enorme bola de fogo que atingirá vários quilômetros, causando inúmeras mortes. “Um projeto com esse potencial de risco de destruição não pode ter, no Centro da Cidade de Santos, um atracadouro de navios-bomba. É preciso afastar este terminal de descarga e a passagem desses navios em centros urbanos”, alertam.
Os ambientalistas lembram do acidente ocorrido em Santos envolvendo o Gasômetro da Vila Nova, cuja explosão destruiu um quarteirão inteiro, na década de 60, deixando 400 pessoas feridas, sendo 40 em estado grave. “O sistema de distribuição é bem semelhante ao pretendido pela Comgás, só que em proporções bem maiores”, finalizam.
PEDIDOS
Os ambientalistas pedem ao procurador e à promotora que formalizem um documento junto à Comgás que afaste o atracadouro oito quilômetros de distância de assentamentos urbanos; que modifique o traçado das tubulações; que transforme o sistema de vaporização de aberto para fechado (para que o ecossistema não seja afetado em função da temperatura da água); que a empresa apresente um sistema de controle operacional seguro e um plano de contingência e evacuação eficazes. Também avaliação de risco de cada 100 metros de tubulação, emissão constante de comunicações de riscos à população e publicidade a um possível processo de evacuação.
“Isso está me cheirando mal”
O professor e ambientalista Élio Lopes dos Santos, mestre em Engenharia Urbana (com ênfase em poluição do ar), químico, engenheiro industrial, pós-graduado em Engenharia de Segurança do Trabalho e de Controle de Poluição garante que o empreendimento é um risco enorme para a Baixada Santista.
“Existe uma licença-prévia junto à Cetesb (Companhia de Tecnologia e Saneamento do Estado de São Paulo) que aprovou a localização e concepção do empreendimento, atestando a sua viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implantação. Agora, é estranho essas audiências em Brasília, pois a discussão deveria ser regional. Plano de contingência, a Barragem de Mariana também tinha. Tenho 40 anos e nenhum deles dá certo. Isso está me cheirando mal”, afirma Lopes.
O professor é um dos pioneiros na área de Meio Ambiente em instituições como Cetesb, Ministério Público Estadual, Ministério da Saúde, Secretaria de Meio Ambiente e universidades locais.
Lopes afirma que empresas dos arredores, como a Ultrafértil, a Usiminas, BTP, a Petrobrás e as que ocupam a Ilha Barnabé deveriam estar questionando o empreendimento sob o ponto de vista econômico e de segurança.
“Os órgãos ambientais deveriam ter mais cuidado e se distanciar do interesse dos empreendedores. Os navios vão trazer o gás do exterior e trabalhar com alta pressão. Os riscos são tecnicamente reais. O sistema aberto de refrigeração que será implantado é mais barato, mas antigo e inadmissível no Mundo por conta de possíveis problemas ao meio ambiente. Ao meu ver, entre outras coisas, esse navio deveria operar longe da nossa costa, mas o custo é grande. Então, optou-se pelo City Gate. Todos os acidentes que eu já avaliei tinham um componente gerador: a ganância”, finaliza o consultor.
Comgás garante a segurança do terminal e das operações
Questionada, a Comgás informou, por sua Assessoria de Imprensa, que o comércio mundial se dá por meio do Gás Natural Liquefeito (GNL). Para o Brasil ter acesso a essa fonte de energia competitiva e limpa é necessário investir em infraestrutura para o recebimento deste insumo.
O projeto em Santos é de suma importância para o desenvolvimento sustentável do Estado e em especial da Baixada Santista, pois permitirá acesso a uma fonte de energia limpa, segura e competitiva, que trará benefícios para a o polo industrial da região e para os demais segmentos de consumo de gás natural: comercial, residencial e transporte.
EMPREGOS E TRIBUTOS
O projeto gerará empregos, tributos e renda. Durante todo o projeto serão criados cerca de 1.500 empregos diretos e ele incorpora a mais avançada tecnologia disponível no Mundo para este tipo de operação. Todos os parâmetros da legislação vigente estão atendidos, assim como todos os requisitos necessários para o seu licenciamento.
Além de atender toda a legislação, o projeto vem sendo amplamente debatido desde 2015, quando foi concebido. Todos os pareceres e todas as manifestações de órgãos competentes foram favoráveis. Os estudos socioambientais foram realizados por consultores especializados e independentes. Audiências públicas foram realizadas em Santos e Cubatão.
Por ter rigorosamente seguido todas essas etapas e pelo fato de os estudos terem demonstrado sua viabilidade ambiental, o projeto já obteve Licença Prévia (LP) emitida pelos órgãos competentes.
BRASIL E MUNDO
Finalizando, a Comgás garante que o terminal de GNL é uma tecnologia segura, amplamente utilizada em todos os continentes há mais de 50 anos, sem registro de incidentes. Há terminais nos Estados Unidos, Japão, Coréia, França, Finlândia, Espanha e Holanda.
O Brasil, revela, já possui quatro terminais em operação, no Rio de Janeiro, Sergipe, Bahia e Ceará. Há ainda outros dois projetos licenciados em implementação, além de outros em estudo.
SÃO PAULO
Todos os terminais existentes no Mundo estão operando em áreas marítimas abrigadas, próximas aos centros de consumo de energia. No Estado de São Paulo, onde a demanda de energia tende a aumentar, Santos figura como única localidade realmente viável, além de segura, para a implementação desta solução