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Nos 50 anos de 1968, relembre 11 fatos que abalaram o mundo

Período de levantes e revoluções, ano foi marcado por protestos estudantis e movimentos de contestação

Rute Pina

Brasil de Fato | São Paulo (SP), 4 de Janeiro de 2018 às 09:27.

Foto da matéria: Repressão do Exército mexicano a protesto estudantil no Zócalo, Cidade do México / Wikicommons.

O ano de 1968 começou com a declaração do Papa Paulo VI de que aquele seria um período de paz, mas entrou para a história por uma série de revoltas e levantes em escala global.

No contexto da chamada Guerra Fria (1945-1991), a juventude se rebelou em todo o mundo e protagonizou uma revolução cultural e nos costumes. Já o Brasil vivia um contexto de endurecimento da ditadura militar, instalada em 1964 e que só viria a ruir em 1985.

Após 50 anos, relembre onze fatos marcantes do “ano que abalou o mundo”.

1 – Protestos contra a Guerra do Vietnã (EUA e diversos países)

No dia 30 de janeiro de 1968, véspera do ano novo lunar do país, os vitcongues, expressão que significa “comunista vietnamita”, lançam uma grande ofensiva contra os estadounidenses e vietnamitas do Sul.

Protesto contra a guerra do Vietnã na cidade de Wishita, no Kansas (EUA) | Wikicommons

Com a operação, a correlação de forças passou a ser mais favorável aos comunistas e mudou o rumo da guerra do Vietnã (1955-1975). Movimentos pela paz se intensificaram nos EUA, gerando protestos e pressão contra o governo de Lyndon Jhonson, que abriu negociações de paz com o governo insurgente do Vietnã do Norte. Os EUA deixaram o país asiático em 1973, mas o conflito se arrastou por mais dois anos.

2 – Primavera de Praga (República Tcheca)

Em janeiro de 1968, Alexander Dubcek assume o governo da Tchecoslováquia (hoje República Tcheca) e inicia uma série de reformas políticas, sociais, econômicas e culturais. Sob a liderança de Dubcek, a Primavera de Praga foi um movimento de massas em busca de um “socialismo humanizado” crítico ao regime stalinista na URSS.

Imagens da invasão soviética à Tchecoslováquia | Flickr/CIA

Em agosto, as tropas da URSS invadiram a Tchecoslováquia, em uma tentativa de reprimir o movimento reformista.

3 – Morte do estudante Edson Luís (Brasil)

Em 28 março de 1968, um protesto de secundaristas no Rio de Janeiro termina com o assassinato do estudante Edson Luís de Lima Souto pela Polícia Militar.

Corpo de Edson foi velado na Assembléia Legislativa, na Cinelândia | Acervo da Biblioteca Nacional

A morte do jovem de 17 anos gera comoção nacional e o velório se transforma em um dos grandes atos políticos contra a ditadura militar. O trajeto entre a Assembleia Legislativa do Rio, onde o corpo foi velado, até o Cemitério São João Batista foi acompanhado por cerca de 50 mil pessoas.

4 – Assassinato de Martin Luther King (EUA)

Em 4 de abril de 1968, o pastor negro estadunidense Martin Luther King, um dos líderes mais importantes do movimento por direitos civis nos EUA, é assassinado.

Martin Luther King durante a marcha em Washington na qual pronunciou o histórico discurso “I have a dream” – eu tenho um sonho | Wikicommons

Ele estava na cidade Memphis, no estado do Tennessee, para apoiar a greve dos trabalhadores em serviços sanitários quando levou um tiro que rompeu sua medula espinhal. Em seu enterro em Atlanta, em 9 de abril, milhares de pessoas saíram às ruas para acompanhar o funeral.

Luther King sonhava com uma sociedade racialmente igualitária em que os negros estivessem plenamente integrados, apoiava a não-violência e se posicionou abertamente contra a Guerra do Vietnã.

5 – Estreia do espetáculo Hair (EUA)

A década de 1960 é reconhecida pela contestação do movimento hippie e a irreverência do rock n’roll. Nos EUA, em abril de 1968, estreava na Broadway o espetáculo Hair, um dos símbolos deste período.

Espetáculo segue sendo apresentado em diversos circuitos pelo mundo. Cenas de nudez ainda são censuradas em diversos países. Imagem de 2016 | Reprodução/ Facebook

O musical símbolo da contracultura hippie é repleto de elementos contestatórios, principalmente a Guerra do Vietnã. Em termos de comportamento, a apresentação chocou o público com cena de nu explícito no palco e referência ao uso de drogas ilegais. Várias de suas músicas viraram hino dos movimentos pacifistas.

6 – Revoltas de maio de 1968 (França)

No dia 3 de maio de 1968, estudantes franceses ocuparam a Sorbonne, universidade mais tradicional do país. As barricadas estudantis logo se alastraram por toda a França e ganharam contornos para além das pautas estudantis.

Trabalhadores em fábrica ocupada no Sul da França, no cartaz, uma série de reivindicações | Wikicommons

Os manifestantes passaram a criticar a política trabalhista e educacional do governo do general Charles de Gaulle, culminando em uma greve geral de 24 horas que paralisou Paris.

7 – Passeata dos 100 mil (Brasil)

No dia 26 de junho de 1968, estudantes, religiosos, artistas como Chico Buarque e Caetano Veloso, e diversos outros setores da sociedade caminharam pelas ruas do centro do Rio de Janeiro contra o regime militar.

Vladimir Palmeira, líder do movimento civil, discursando durante a Passeata dos Cem Mil | Wikicommons

O protesto é um ápices dos movimentos contra a ditadura no período e culminou em uma reação dos militares, com o decreto do Ato Institucional nº 5 no dia 13 de dezembro. O AI-5 é considerado o mais arbitrário dos decretos dos militares e deu poderes quase absolutos ao governo, dissolvendo a liberdade de expressão e os direitos políticos no país.

8 – Estudantes são presos em Congresso da UNE em Ibiúna (Brasil)

Em 1968, a União dos Estudantes (UNE) atuava na clandestinidade e suas reuniões estavam proibidas pelo regime militar. Ainda assim, a entidade marcou congresso anual naquele ano e reuniu cerca de 1,2 mil pessoas em Ibiúna (SP).

Notícia da prisão dos estudantes reportada pelo jornal O Estado de S. Paulo | Reprodução

A Polícia Militar invadiu o encontro e todos os estudantes foram presos e levados ao Departamento de Ordem Política e Social (Dops), entre eles as principais lideranças estudantis do país. A ação fez a UNE reduzir seu tamanho e permitiu que o governo militar fichasse centenas de estudantes que futuramente foram perseguidos, como José Dirceu, que à época disputava a liderança da entidade.

9 – Massacre de Tlatelolco (México) 

Apenas dez dias antes dos Jogos Olímpicos do México um protesto de estudantes em Tlatelolco, no centro da capital do país, foi brutalmente reprimido pelo Exército mexicano. O presidente Gustavo Díaz Ordaz Bolaños buscava sufocar o movimento estudantil — acusado por ele de influência externa comunista — antes da abertura do evento. Os jovens pediam mais liberdades civis e a punição de casos de repressão policial.

Protesto estudantil teve início nas escolas secundárias e tomou conta do país devido à repressão policial | Reprodução/ YouTube

Até hoje, o número de mortos no massacre é incerto. O número oficial 40 mortos é questionado: algumas fontes falam em mais de mil mortes na noite de 2 de outubro de 1968.

10 – Atletas negros protestam em Olimpíadas (EUA/México)

No segundo dia das provas de 200 metros rasos nas Olimpíadas da Cidade do México, no dia 16 de outubro de 1968, o atleta estadounidense Tommie Smith justificou seu favoritismo e levou o ouro com o tempo de 19,83 segundos. Já o compatriota John Carlos levou o bronze.

Tommie Smith e John Carlos erguem o punho durante hino nacional dos EUA | WikiCommons

Durante a cerimônia de premiação, Thommie e John manifestaram apoio ao movimento de direitos civis e pela vida do povo negro norte-americano. Os dois subiram ao pódio erguendo o punho fechado com luvas pretas, saudação utilizada pelo movimento Black Power e pelos Panteras Negras. O gesto é considerado o mais emblemático e político na história dos Jogos Olímpicos.

11. Greve em Contagem – Minas Gerais (Brasil)

Em abril de 1968, ocorreu a primeira grande greve no Brasil desde que os militares tomaram o poder quatro anos antes. Articulada pelo Sindicato dos Metalúrgicos, a paralisação mobilizou por dez dias cerca de 1,2 mil trabalhadores em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte. Os trabalhadores da siderurgia Belgo-Mineira reivindicavam um  reajuste salarial de 25%.

Movimento de Contagem serviu de inspiração para outras ações sindicais pelo país | Reprodução

Durante a greve, o coronel Jarbas Passarinho, então ministro do Trabalho, intimidou os grevistas pessoalmente e na televisão. No dia 24 de abril, policiais militares tomaram a região industrial de Contagem e os operários foram ameaçados de demissão sumária. O movimento terminou no dia 26 de abril. Os trabalhadores conquistaram 10% de reajuste, abaixo da pauta, mas uma vitória frente à política de arrocho salarial imposta pela ditadura.  Além disso, a greve reacendeu o sindicalismo no país. Em julho, por exemplo, cerca de 3 mil trabalhadores da Cobrasma, metalúrgica em Osasco, na Grande São Paulo, anunciaram a ocupação da fábrica.

Edição: Vanessa Martina Silva

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