O Sertão vai Virarmar

Pescador e capoeirista, nordestino pelas duas nascentes

 

 Por Jasper Lopes.

Opescador artesanal caiçara e capoeirista Sandro Gomes é um caso pitoresco onde pelo menos duas nascentes convergem em diferentes aspectos da raiz nordestina. Nascido já em Santos, é filho do pescador Nego Jaime (nascido em São Lourenço da Mata, Pernambuco) e da Dona Alaíde (também conhecida como Nega, e oriunda de Campina, Pernambuco). A atividade de pesca artesanal, praticada pelo pai no Nordeste, e que segue uma tradição familiar, acabou passando para o filho. Sandro relembra a história familiar da migração para o Sudeste, precisamente a baixada Santista: “Primeiro, eles estudaram na mesma escola, lá no Pernambuco, e minha mãe odiava o meu pai (risos).

Na gravidez de outro homem, minha mãe fugiu para São Paulo, e aqui, por não conhecer ninguém, se sentiu obrigada a ficar com meu pai, e inicialmente ficaram na colônia de pescadores que havia em São Vicente, cujo presidente era um tal Brizola, a Z 4, bem na beirada do Mar Pequeno, próxima à Ponte Pênsil. Depois vieram para a Ocian, na Praia Grande. Afinal, acabou amando tanto meu pai que até hoje está triste pela morte dele, faz menos de um ano”.

“Antigamente a pesca era boa aqui na Praia Grande, mas teve um desequilíbrio por causa do emissário submarino na Vila Turpy, é muita coincidência e nós achamos que é por causa dele, que a Prefeitura joga muitos produtos químicos que vai para a água. Antes dava tanto peixe que alguns que ao interessava, a gente devolvia para a água, jogava. Nós começamos, com meu pai, na “Tamanca” (tipo de barco artesanal com um remo só, nos conta Sandro). Depois compramos a lancha a motor, melhorou o desempenho, por volta de 1997. Mas de uns 15 anos para cá foi ficando escasso, uns meses atrás então, nunca vi igual, tivemos que abandonar a pesca por um tempo, não havia nada, nunca vi coisa assim, tive que fazer bicos, como pedreiro, uma tristeza, agora faz uns dias apareceu de novo um peixinho ou outro”.

Pescador e capoeirista, nordestino pelas duas nascentes - Sandro Gomes (7)
Sandro exige então, orgulhoso, no seu smartphone, as fotos dele e a esposa, Bia, com um peixe enorme, ainda em cima da lancha. Perguntamos que peixe é: “É miraguaia, peixe carnudo, dá mais no verão, saboroso. A tainha já não aparece por aqui. Antes também pegávamos cação, corvina… Agora é só pescada, assim mesmo, mais ou menos. Às vezes vemos até baleias, temos essa aqui filmada no celular, olha só!” E nos mostra o vídeo, no celular, com brilho nos olhos. “Às vezes acontece de encontrarmos enroscado nas redes algum bichinho, ou até vemos boiando em dificuldades, debilitado, e levamos para os biólogos da Bio-Pesca, que está numa rua aqui do Forte, lá eles tratam os bichinhos e quando ele está bom de saúde novamente, devolvem para o mar. Aparecem pinguins, tartarugas, por aí vai”.
Perguntamos a Sandro sobre algum “causo” de pescador, algum fato mais intrigante, algum perigo que passou. Ele relata que muitas vezes a tempestade não se anuncia facilmente, principalmente aquela que é ‘seca’, apenas elétrica, que é o maior perigo. Além do olhar de pescador, eles também consultam a meteorologia antes de partir pro mar. “Teve uma vez que uma descarga elétrica caiu bem pertinho na água, então eu também fui atingido, por sorte caí de costas dentro do barco, fiquei tremendo com o choque, quando passou e tentei sair, em cinco minutos veio outra descarga, outra vez caí e tremedeira. Algum mal súbito deve ter pego nosso amigo pescador Vagner Amaral, que desapareceu e encontraram ele depois de alguns dias, foi notícia nos jornais faz umas semanas. Como ele estava sozinho, o que é normal, pode ter tido um mal estar e caído na água,em vez de no piso do barco. Esse é o maior perigo que corremos”. “Às vezes saio pro mar com a Bia, minha mulher, ela gosta de me acompanhar, ela não tem medo e é dura na queda!”.

Da raíz jangadeira pernambucana à capoeira afro-baiana

Quem vê Sandro, com perfil típico daquela região nordestina, branco bronzeado com olhos ligeiramente esverdeados, não sabe que habita em seu ser o espírito típico da negritude de Salvador do capoeirista por devoção. Perguntamos como começou sua relação com a capoeira: “Foi através do convite de um amigo, o xará Sandro Alves, há mais de 20 anos atrás, para participar no grupo São Jorge, com o mestre Malaquias. Depois que o mestre faleceu, na minha opinião o grupo não conseguiu mais ser o mesmo que o mestre deixou, aí fui para outro, o Rosa Negra, com o mestre Surray Haddad, um dos pioneiros a fazer capoeira aqui na Praia Grande. Ele era também advogado, fazia parte do júri da cidade. Gostei por causa da disciplina, comparável com a do antigo mestre Malaquias. Com o falecimento do mestre Surray, quem assumiu foi o filho dele, também muito bom,o Haddad, que é diretor também da Federação Paulista de Capoeira. Gostei de cara da capoeira, porque não deixa o corpo travado como as lutas marciais orientais, tem molejo e espírito mais descontraído” Sandro possui já o cordão marelo e branco, de professor, o próximo passo é o azul e branco, de contra-mestre, e finalmente o branco, de mestre de capoeira (pelas regras da Federação Paulista, afirma que na Bahia tem alguns detalhes diferentes).afirma que na Bahia tem alguns detalhes diferentes).afirma que na Bahia tem alguns detalhes diferentes).

Pescador e capoeirista, nordestino pelas duas nascentes - Sandro Gomes (1)Pescador e capoeirista, nordestino pelas duas nascentes - Sandro Gomes (2)Pescador e capoeirista, nordestino pelas duas nascentes - Sandro Gomes (3)
Nas aulas que dá de capoeira, Sandro é acompanhado também pela esposa Bia (Beatriz Silva Mendes), e, o que é uma verdadeira atração, pela filhinha Duda (Maria Eduarda), com sua roupinha de capoeira e que também ensaia seus primeiros passos na arte, participando na roda, e que chora caso o pai não a faça participar, gostando também de bater no pandeiro. Detalhe: a mãe, Bia, é baiana como a capoeira.

Capoeirista
Pescador e capoeirista, nordestino pelas duas nascentes - Sandro Gomes (4)Atualmente Sandro formou uma ramificação do seu grupo, que se chama “Sementes da Rosa Negra”, com aulas às terças e sextas de noite, no espaço cultural Verde América, no Jardim Quietude, em Praia Grande.

fonte:www.odialeto.com.br

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