No último dia 07 de fevereiro, os indígenas da aldeia Paranapuã, na cidade de São Vicente (litoral de São Paulo), foram surpreendidos por uma vistoria realizada pela Polícia Militar Ambiental a pedido da gestão do Parque Estadual Xixová-Japuí. Acompanhados por técnicos da Funai e o novo coordenador regional, estavam presentes também monitores ambientais do Parque, bem como a própria gestora da Unidade. A partir de denúncia encaminhada pela Fundação Florestal, os policiais lavraram dois Autos de Infração Ambiental relacionados ao roçado para plantio de um indígena e à reconstrução de uma habitação de outro parente.
Esta ação – sem precedentes no local, de acordo com os indígenas – baseou-se na justificativa de que o manejo realizado é caracterizado como supressão da vegetação e que impede a regeneração natural da mesma. Fato é que essa mesma área já havia sido utilizada inúmeras vezes para o cultivo de espécies de interesse dos índios e que a prática de roçado para a “limpeza” da área é parte do manejo tradicional com o objetivo de preparar o solo para novos plantios – que dependem de condições ambientais e espirituais específicas. O embargo realizado na área autuada impede que qualquer intervenção possa ser realizada pelos indígenas.
Já a re-construção da residência foi justificada pelas necessidades de reparos de danos causados pelas chuvas e desgastes do tempo e ainda pelas condições precárias das habitações, já que os indígenas são impedidos de acessar os recursos da área e não há qualquer política de habitação no local. De acordo com o Parque, a construção de uma nova residência não foi autorizada, entretanto o indígena autuado desmanchou a antiga casa e a re-ergueu em outro local, não sendo possível configurá-la como “nova residência”. Sua casa também foi embargada.
Contexto da aldeia
A aldeia Paranapuã, território indígena guarani, ainda não foi demarcada pelo Estado. Composta por por três núcleos habitacionais, sua população está em torno de 100 pessoas. Devido à situação de sobreposição ao Parque Estadual Xixová-Japuí (São Vicente; Praia Grande) a ocupação indígena está judicializada por uma Ação Civil Pública movida pelo Estado de São Paulo e a decisão em primeira instância (2015) é pela retirada da comunidade guarani de seu território tradicional.
Por este motivo, vários conflitos decorrem da ação do governo estadual contra os guaranis, desde o âmbito da judicialização às ações cotidianas que podem ser caracterizadas como essenciais à sua reprodução física e cultural. É nítido que o tratamento dados aos indígenas pelo Parque demonstra maior rigor do que o controle da área protegida nas interfaces com o grande complexo do shopping da Praia Grande ou o acesso irrestrito nas imediações do bairro vizinho.
Impedimentos
Os guaranis relatam também constrangimentos que têm passado com as constantes vigilâncias e o receio de novas autuações. O que ocorre é a falta de respeito no diálogo do Parque com os indígenas e o despreparo para compreender suas especificidades culturais, tomando-os como pessoas a serem tuteladas e que necessitam de orientação para viverem de modo mais civilizado. Todas essas questões configuram o racismo institucional associado e a perseguição aos guaranis por conta da disputa pelo território, o que demonstra as estratégias do Estado e as violências impostas na tentativa de fragilizá-los e desestruturá-los.
Contexto amplo
Este episódio é mais um conflito que se acirra em torno do governo do estado de São Paulo. A situação das aldeias em sobreposição à Unidades de Conservação de Proteção Integral, como parques estaduais, atinge também outros casos judicializados e de repressão às práticas indígenas tradicionais de subsistência.
Um caso conhecido é a Terra Indígena Jaraguá que teve sua portaria declaratória anulada pelo Ministério da Justiça em 2017, apresentando como uma das justificativas a não participação do governo do estado de São Paulo e a sobreposição ao Parque Estadual do Jaraguá. Contraditoriamente ao discurso da pauta de meio ambiente do estado, foram os indígenas do Jaraguá que se colocaram recentemente contra a tentativa do grupo Tenda Imobiliária S.A. de derrubar de 4 mil árvores para a construção de conjunto habitacional na região de entorno da Terra Indígena e do Parque. O parecer da Fundação Florestal foi favorável à empresa. https://www.facebook.com/
Conclusão
Por fim, a compreensão sobre os modelos de conservação ambiental e os impactos da ocupação humana no meio em que vivem devem ser vistos de modo crítico. Nessa perspectiva é essencial levar em consideração a história da resistência indígena, a luta da retomada de seus territórios e o respeito ao seu modo de vida tradicional.
O Estado e os grandes empresários usam a máquina administrativa e burocrática para subjugar as comunidades indígenas. Chamamos a atenção para a falta de respeito e a violência utilizada no caso da aldeia Paranapuã, personificada por agentes que os vigiam e pelo medo instaurado de possíveis novas autuações ambientais. Quanto aos impedimentos para as práticas de roça tradicional ou reforma das casas – sob alegação de impacto ambiental – são claras tentativas de criminalização do modo de vida indígena com o objetivo de fragilizar o grupo. Esta é uma estratégia de inviabilizar a permanência guarani em seu território.
A expansão colonialista que expulsou os guaranis de seu território e desmatou mais de 70% da vegetação de Mata Atlântica no estado de São Paulo continua até os dias de hoje seu projeto genocida. A política ambiental é mais um instrumento para impedir que indígenas tenham acesso aos seus territórios tradicionais. Contraditoriamente, as áreas mais preservadas são aquelas cuidadas pelos indígenas! (Fonte: https://www.socioambiental.
Onde tem índio, tem floresta em pé!