Por Geraldo Varjabedian
Não é à toa que vivemos em um mundo abandonado, cheio de monumentos e lacrações, manchetes e receitas meritocráticas de sucesso, um mundo doente, porém, repleto de heróis protagonistas, todos de pau em riste, dando conta de grandes pautas, grandes feitos, grandes ideias, mas incapazes de enxugarem o próprio mijo ao redor da privada ou decidirem pela sensatez de mijarem sentados.
O que não falta neste mundo de conservadores travestidos de revolucionários são os incapazes de encontrar paz nas pequenas coisas.
Que imenso sacrifício deixar de lado o que chamam de “menor” para ser parceiro, cúmplice, sócio e até serviçal dos que dão as cartas, né?
Que grande honra endossar os poderes instituídos, pautar a vida pelas prioridades instituídas, lutar sentado no colo do machismo instituído, que a tudo de seu justifica como certo, urgente, prioritário -negligenciando o óbvio.
Do plantio de alimento ao cuidado com os filhos, do fazer artesanal à poesia, do repetitivo ao inovador, tudo é menor diante dos holofotes sociais estabelecidos.
Ah, os conservadores travestidos de revolucionários. Que farsa cara ao capital!
Deve ser por isso, também, que a maioria dos grandes-grandes-grandes não lidam com educação, não falam com pobres, não fazem “coisas” de mulher, não assumem pequenos fazeres e nunca têm o tempo e a serenidade necessários para questionar a envergadura dos próprios braços.
Deve ser por isso que não fazem questão alguma de romper com as muralhas da linguagem, descalçar as botinhas ortopédicas da normalidade…
Eles só sabem ser grandes. O que chamam de “fazeres menores” é o que traduzem, dentro de si, por humilhação.
Logo, menores são os que fazem os fazeres menores. Eles, não.
Como dizia minha avó, cerzideira: – “Homens não dão a menor importância a quem reformas as calças dos que dão passos maiores que as pernas”.
Esses são os caras que mandam ou querem mandar no mundo, fazer, acontecer, transformar, governar, decidir pelo coletivo, disputar, competir, reinar… E isso não é prerrogativa dos conservadores de direita, não.
E no mundo da tragédia socioambiental, deveria ser diferente?
Penso que a transformação real passa pelos fazeres pequenos, pelo compartihar do que falta ao coletivo, pela microrrevolução de entender a saúde que há no anonimato, na simplicidade, no não precisar…
Ando exausto dos que vêm falar em ecologia, sustentabilidade, ambientalismo, sem enterrar uma única semente no chão, enquanto o mercado, o patriarcado, a doença sistêmica, a competição queimam por dentro, na forma de ansiedade. Ansiedade por fazer, por ter, por acontecer, por manter viva a maldição do vir a ser…
Como é possível aos semeadores, semearem um novo mundo, se são incapazes de cuidado com o que tem a proporção de uma semente?