Rafael Moreira

O 8 de março e a Reforma da Previdência

Todos os anos as mulheres saem às ruas no dia 8 de março para lutar por seus direitos. Para além dos programas especiais sobre mulheres na TV e das flores que as empresas distribuem a suas funcionárias, esse dia marca um histórico de luta das mulheres de todo o mundo por melhores condições de vida para si e para todos. Nesse ano de 2017 não será diferente e uma das pautas centrais do movimento no Brasil para o 8 de março é o combate à aprovação da PEC 287, conhecida como Reforma da Previdência.

Apesar das mulheres terem conquistado o direito ao voto e terem ingressado no mercado de trabalho e na vida política brasileira (chegando ao cargo máximo da Presidência da República), as desigualdades ainda se perpetuam em outras esferas. As mulheres brasileiras tem hoje o direito formal de trabalhar fora de casa, mas os dados mostram que o acesso ao mercado de trabalho é ainda negado como oportunidade real a grande parte das mulheres. Enquanto 56% das mulheres fazem parte da força de trabalho no Brasil, esse percentual chega a 80% no caso dos homens. Além de ocuparem menos postos de trabalho, as mulheres ganham em média 65% do salário dos homens no mercado informal e 75% no formal, segundo os dados da pesquisa PNAD-IBGE de 2014.

A barreira invisível que afasta as mulheres do mercado de trabalho formal e que as insere nos postos de trabalho mais precários e mais sazonais é feita de um trabalho igualmente invisível. Além de ganharem menos que os homens para exercer as mesmas tarefas fora de casa, as mulheres são responsáveis pela maior parte do trabalho dentro de casa, um conjunto de tarefas domésticas e de cuidados que não são chamados de trabalho, mas que tomam, em média, 20 horas por semana da vida de uma mulher, segundo dados da mesma PNAD-IBGE.

E é justamente o reconhecimento desta dupla jornada de trabalho (dentro e fora de casa) que garante às mulheres a idade mínima de aposentadoria aos 60 anos, enquanto a dos homens permanece em 65 anos. Não se trata de um privilégio concedido pelo Estado a mulheres, mas sim de um direito conquistado a partir do reconhecimento sobre a ausência do próprio Estado no provimento de equipamentos e políticas voltados ao cuidado e à garantia da sustentabilidade da vida humana. Nesse sentido, a proposta de Reforma da Previdência que tramita no Congresso Federal retrocede neste reconhecimento e retira de grande parte das mulheres brasileiras o direito a uma vida digna na velhice, especialmente daquelas com menor renda e que ocupam a maior parte dos postos informais de trabalho.

Se aprovada, a PEC 287 igualará a idade mínima para aposentadoria de homens e mulheres em 65 anos, além de ampliar o tempo mínimo de contribuição para 25 anos (hoje são precisos 15 anos de contribuição). As mulheres de classe média terão que recorrer ao sistema de previdência privada, enquanto as mulheres mais pobres (como as trabalhadoras rurais e as trabalhadoras informais) terão formalmente negado seu direito a aposentadoria.

A proposta aprofunda, assim, as desigualdades existentes entre homens e mulheres no acesso e permanência no mercado de trabalho, ao invés de reconhecê-las e combatê-las.  

Por isso, nesse dia 8 de março, mulheres de todo o país estarão mobilizadas contra a Reforma da Previdência, relembrando o histórico de lutas e conquistas das mulheres que as precederam e lutando, no presente, por um futuro mais justo para todas.

* Thandara Santos é socióloga formada pela USP e pós-graduada em Estudos de Mulheres e Gênero pela University of Hull.

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