Por Jovens Cronistas.
Não. Esse não é o caminho para combater a difusão de mentiras, as tais fakes news
No início do ano a mais popular das redes sociais do ocidente, o Facebook, do bilionário estadunidense Mark Zuckerberg, viu de perto a falência por conta da ameaça de multas, que beiravam 2 trilhões de dólares, após autoridades estadunidenses e britânicas apontarem que a rede repassou informações particulares de mais de 86 milhões de usuários a Cambridge Analytica, empresa inglesa de análise de dados com fins políticos que deu suporte a campanha eleitoral do presidente dos EUA Donald Trump e fechou as portas em maio após o escândalo. Como se trata, no popular, de “briga de cachorro grande”, o jovem dono de um patrimônio líquido avaliado em 67 bilhões de dólares não foi punido e os usuários, que tiveram dados usados pela consultoria na elaboração da campanha republicana, não ultrapassaram o campo em que figuram penas dígitos de uma cifra milionária lesados.
A perda de valor da empresa no mercado de ações pouco tem a ver com os escândalos envolvendo a empresa. Não se questiona que a empresa tem se desvalorizado com a pressão política sobre Zuckerberg, mas, no mais recente recuo, a queda em 120 bilhões de dólares em apenas um dia, os acionistas e investidores, que desejam o jovem fora da direção da empresa, sentiram-se prejudicados com a receita, na casa de 13,2 bilhões de dólares no trimestre encerrado em junho, abaixo do projetado por analistas que previam algo na ordem de 13,36 bilhões de dólares para o mesmo período. O valor representa a maior perda de uma empresa no índice Nasdaq – principal bolsa de valores dos EUA- desde 2000, quando a Intel perdeu algo em torno de 91 bilhões de dólares também em apenas um dia.O intenso lobby de empresários do setor sobre parlamentares e a falta de interesse da opinião pública sobre o tema, que é difundido como sendo algo de difícil compreensão, levam ao fenômeno internacional da ausência de regulamentação sobre meios tecnológicos, como as redes sociais, e acerca da manipulação de dados pelas empresas. Para tanto, no caso do Facebook, a punição à Zuckerberg, CEO da empresa, por enquanto, resume-se a depoimentos ao Congresso dos EUA, pelo envolvimento na campanha republicana, e ao Parlamento Europeu, que suspeita da utilização mesmo mecanismo na campanha pelo BREXIT – que pede a saída do Reino Unido do bloco europeu. Acompanhado às explicações, há a assinatura de termos de compromisso, assumidos perante os mesmos órgãos, para a implantação de sistemas de proteção aos dados dos usuários. As investigações seguem, porém com pouca, quase nenhuma, expectativa de punição que não a simbólica do discurso de que não “se repetirá”.
No Brasil, a empresa é reconhecida por não conceder informações à Justiça, no campo das investigações contra organizações criminosas. Em fevereiro deste ano, o Superior Tribunal de Justiça – STJ determinou o pagamento de 3,96 milhões de reais em multa à Vara Federal de Guarulhos, em São Paulo.Se já não bastasse responder pelo vazamento de dados para elaboração de campanhas de cunho político, o Facebook esteve no centro de outro escândalo também relacionado o uso de dados sem autorização. Saiu de cena a consultoria política e entrou um time de peso integrado por Samsung, Apple e Blackberry, empresas do ramo de telefonia que, segundo noticiou o jornal estadunidense The New York Times, utilizavam as informações de usuários e de seus contatos na criação de aplicativos para seus aparelhos. Mark Zuckerberg, já sem muito discurso, novamente pediu desculpas e reforçou que tem melhorado o sistema de proteção de dados.
O vazamento de dados busca, na maioria dos casos, criar conteúdo levando em consideração as preferências e alinhado ao perfil do usuário. Para as eleições de outubro, o comandante do Facebook, rede social com mais de 130 milhões de brasileiros registrados, prometeu não impedir vazamentos de dados, mas “fazer de tudo” para manter a integridade do pleito ante o avanço de notícias falsas, as chamadas fake news. Desde o comentário, em meados de abril, a rede firmou parceria com a “Lupa”, agência de checagem de dados apoiada pelo jornal Folha de S. Paulo e pela revista Piauí, ligada ao diário paulista e idealizada pelo herdeiro do Itaú/Unibanco, o banqueiro João Moreira Salles.
No dia 25/07 o Facebook divulgou números que seriam de uma investigação interna: a exclusão de 196 páginas e 87 usuários de sua rede por, supostamente, colaborarem com a difusão de notícias falsas e, a confirmar a acusação, manipular a pauta do debate na rede mundial de computadores, a internet. Segundo a plataforma, as contas integrariam um grupo orquestrado para o compartilhamento de publicações com origem desconhecida e ligado ao Movimento Brasil Livre – MBL, coletivo político de extrema-direita.A equipe de jornalistas especializados em análise de dados da agência faz o trabalho de verificar e autenticar o conteúdo, sem que, em um primeiro momento, venha a suspender ou pedir a exclusão da conta, já que, em contrato, o Facebook assegura que não retira usuários da plataforma por compartilhamento de notícias falsas. A avaliação feita pela agência de checagem baseia as medidas restritivas tomadas pela rede de Zuckerberg, como a redução no alcance das publicações e a suspensão temporária de contas.
O movimento da rede de Zuckerberg incorre num perigo e despropósito muito grandes. Primeiro porque está claro que, mudando a perspectiva de adversários do tucano, pode-se implicar esta censura a veículos com outra corrente ideológica, justificando que se trata também de propagadores de fake news. Segundo, por ser inconcebível que uma empresa privada, apesar de ser a proprietária do sistema, tenha a prerrogativa de definir o que é ou não notícia falsa, ainda mais se tratando de um fenômeno recente e com poucas explicações. A título de explicação: este blog é um veículo de opinião, portanto não nos enquadramos na categoria excluída do Facebook, pois não produzimos notícias e, sim, opinamos sobre o que é notícia.Bem, no entendimento deste blog a suspensão e o bloqueio das contas pela rede social implicam em um ato antidemocrático e político. O leitor que nos acompanha sabe que o projeto Jovens Cronistas!, que é de opinião, tem posicionamento ideológico, confessa e orgulhosamente, à Esquerda – progressista, como preferir – no que tange a cobertura política. Porém, estar nessa posição não nos permite aplaudir o episódio que, desta vez, prejudicou “nossos adversários” no campo ideológico. Afinal, como já exposto, o grupo que está determinando quem produz ou não fake news nas redes tem claramente uma preferência política, que caminha na direção da candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB) e de Marina Silva (REDE), e visa, claramente, a desestabilização de apoiadores do grande adversário do tucano ou de qualquer outra postulação que busca vencer a corrida pela Presidência da República: o candidato Jair Bolsonaro (PSL), presidenciável notoriamente conhecido por seu elo com grupos investigados por divulgar notícias falsas na internet.
É claro que, sim, o MBL guarda em suas bases a propagação de notícias falsas (e são notícias porque tem estrutura de texto jornalístico, que em muito difere de um artigo de opinião, como este e tantos outros publicados pelo JC) para desestabilizar e linchar publicamente os seus adversários políticos. Longe deste blog fazer a defesa dos ilícitos do dito Movimento Brasil Livre. Em um entendimento muito claro, cabe ao Estado, com uma estudada e coerente Regulamentação da Mídia, (leia-se que “regulamentação” difere, em muito, de “regulação” como propagam os militantes, jornalistas e militantes-jornalistas da Direita) que defina o que é ou não notícia; o que pertence ao campo da opinião; o que pode e o que não pode ser dito, como referir-se a outro em uma crônica, uma “notícia”, ou mesmo em um programa de TV, YouTube ou de rádio – aqui vale um abraço a turma do pseudoprofessor Villa, do “menino Brasil” e da “senhora Magalhães”.
A proposta nada tem a ver com “censurar”. Se considerada, é caminho que impede a violação de direitos individuais. O direito à liberdade de expressão é pleno, desde que a “expressão” não seja difamatória e um meio para atacar a figura do outro e de seus ideais. Nessa linha, cabe apenas ao Estado o papel de regulamentar o que fere ou não o direito dos indivíduos, e não de uma corrente política encampada por um bilionário do mercado tecnológico e, no Brasil, por um banqueiro com a corporação midiática por trás. Não, o caminho para combater a difusão de mentiras não é esse.
Por: Adriano Garcia e Claudio Porto
Fonte: https://jcronistas.blogspot.com